O divórcio é um acontecimento que implica necessariamente a reorganização familiar, é um período de «crise» que envolve muitas mudanças. Neste processo os pais devem manter-se atentos e tentar satisfazer as necessidades dos filhos, algo que se pode revelar muito difícil quando os pais estão mergulhados em sentimentos negativos como a tristeza e o ressentimento, rejeição ou fracasso.
Num período conturbado de grandes mudanças familiares, como é o divórcio, é fundamental que os pais consigam fazer uma adequada gestão destas emoções negativas e consigam dar resposta às necessidades dos filhos. É muito importante que os pais separados respeitem as rotinas e os rituais das crianças, para que as mudanças não sejam demasiado grandes e as crianças consigam manter alguma estabilidade.
No que respeita ao percurso escolar dos filhos e às suas tarefas escolares, ambos os pais devem acompanhar de perto o percurso dos filhos e colaborar no estabelecimento de rotinas promotoras do seu sucesso académico. Embora não seja um processo fácil, é possível e aconselhável que os pais estabeleçam uma comunicação adequada, direta e assertiva relativamente a tudo o que diz respeito aos filhos, incluindo as questões escolares, que partilhem informação relevante e tomem decisões conjuntas relativamente a questões importantes do quotidiano da criança.
Não há «receitas» mágicas nem regras que se apliquem a todas as situações familiares. Sem esquecer que cada família é única e cada uma pode apresentar necessidades diferentes, os pais devem estabelecer padrões de comunicação e acordos próprios em benefício dos seus filhos. Colocar as necessidades das crianças/jovem acima das suas desavenças e sentimentos negativos é o aspeto fundamental para minimizar o sofrimento dos filhos e contribuir para o seu ajustamento psicológico.
O insucesso escolar é muitas vezes o «espelho» da instabilidade emocional de uma criança. Quando existem situações de instabilidade familiar, como sendo o divórcio, violência doméstica, negligência ou outras, é comum a criança apresentar um decréscimo no seu aproveitamento escolar, sendo este um dos principais sinais de alerta para pais, educadores e outros adultos significativos que fazem parte da vida da criança. Se a criança não se encontra emocionalmente bem, se está triste, preocupada, ansiosa ou com medos intensos, é expectável que a sua motivação escolar diminua e que a sua disponibilidade para a aprendizagem fique comprometida.
Divórcio: O apoio psicológico é fundamental
É comum depararmo-nos com situações destas nas escolas e também no contexto de prática clínica. É muito importante ajudar estas crianças a expressar os seus sentimentos e ajudá-las a gerir as suas emoções.
Nomeadamente numa situação de divórcio, e sobretudo de conflito entre os pais, nem sempre as crianças conseguem expressar facilmente os seus sentimentos. O apoio de um profissional pode ser fundamental para ajudar neste processo, a relação terapêutica de confiança, empatia e aceitação favorecem a expressão de sentimentos por parte da criança.
Quando estamos a falar de crianças mais pequenas, muitas vezes a expressão de sentimentos não é feita de forma direta ou verbal pois, devido ao seu nível de desenvolvimento, ainda não possuem as capacidades cognitivas, de diferenciação ou expressão emocional necessárias, mas fazem-no de forma indireta, através do lúdico, como o brincar ou o desenho.
Para além do insucesso escolar, existem outros sinais de alerta que geralmente podem estar associados a situações de instabilidade familiar e que merecem atenção. São frequentes problemas de comportamento, quer em casa quer em contexto escolar, maior irrequietude, problemas de atenção e concentração, problemas relacionais com o grupo de pares e, nalgumas situações, a criança ou jovem pode revelar um maior isolamento e desinteresse por atividades antes praticadas com entusiasmo. É necessário estar atento a estes ou outros sinais que a criança evidencie. No fundo é necessário que os pais estejam atentos a todas as alterações comportamentais ou emocionais que os filhos possam revelar.
Que cuidados devem ter os pais separados?
Para os pais que estão a passar, ou passaram, por uma situação de divórcio é importante apontar alguns aspetos que contribuem para uma melhor adaptação dos filhos à separação e às mudanças que daí decorrem:
- Manter uma relação construtiva de colaboração e respeito com o ex-cônjuge, tendo sempre em mente que têm um projeto em comum, a educação dos seus filhos;
- Manter com o pai/mãe dos filhos uma comunicação assertiva, direta, procurando não recorrer a intermediários;
- Evitar «jogos» de recriminação e acusações com o ex-cônjuge, ter cuidado com a linguagem utilizada, sobretudo na presença dos filhos;
- Saber separar o papel de ex-cônjuge do papel de mãe e pai, adotando novos padrões de comportamento e assumindo uma parentalidade conjunta positiva;
- É fundamental dar segurança e estabilidade aos filhos, dando-lhes atenção e amor, usufruindo de tempo de qualidade com eles;
- Respeitar o tempo que o outro progenitor passa com os filhos;
- Conversar e escutar os filhos, pedir a sua opinião relativamente a alguns aspetos, o que não significa que a tomada de decisão seja deles. A tomada de decisão e a responsabilidade de decidir deverá ser sempre dos pais;
- Não esquecer a implementação de regras claras e rotinas. Evitar um estilo parental e práticas mais permissivas como forma de «compensar» os filhos pelo sofrimento que o divórcio dos pais causou. Isto só fará aumentar a instabilidade familiar e a insegurança da criança, podendo a longo prazo ter repercussões negativas no seu desenvolvimento.
Um exemplo a seguir!
Este é um caso de sucesso e um exemplo de como é possível, apesar de todas as dificuldades que os pais possam sentir, gerirem as suas emoções negativas, colocarem os seus desacordos em segundo plano e dar prioridade às necessidades dos filhos, estabelecendo uma relação de colaboração e respeito.
Os pais do R., de sete anos, procuraram o meu apoio em clínica, após terem decidido separar-se. Foi uma decisão repentina para o R., na medida em que o menino nunca presenciou uma relação conflituosa entre os pais. Após terem tomado a decisão de separação, os pais haviam conversado com o filho e explicado, de forma adequada à sua faixa etária, que os pais iriam viver em casas separadas pois a relação iria terminar.
Contudo, apesar desta (grande) mudança continuariam a amá-lo da mesma forma e continuariam a estar presentes na sua vida como até ali. Procuraram apoio psicológico para o R. apesar de o menino não apresentar sinais de alerta, contudo, queriam certificar-se que ele conseguiria adaptar-se bem às mudanças.
O seu rendimento escolar manteve-se positivo, o seu comportamento e relações na escola igualmente. Os pais conseguiram chegar a um entendimento, definindo claramente o tempo que o R. passava com cada um deles, adotavam uma linguagem positiva na presença do filho e mostravam-se entusiasmados quando este relatava uma experiência positiva que havia tido com o outro progenitor.
O R. ia às consultas com ambos os pais e qualquer alteração na sua rotina era combinada entre ambos. Ambos fazem parte da sua vida e têm uma palavra a dizer nas decisões importantes. Ao contrário do que se possa pensar, estes pais tinham conflitos entre si, discordavam em muitas coisas, tinham opiniões e perspetivas diferentes sobre o que levara ao fim do casamento, estava a ser um processo doloroso e difícil para ambos mas havia um aspeto que se sobrepunha, a felicidade e o bem estar do R.
O menino adaptou-se bem às mudanças e o meu apoio foi apenas uma «segurança» para a família, dando algumas orientações em momentos pontuais. No futuro surgirão certamente outros desafios, mas acredito que estes pais têm os recursos necessários para lidar com as dificuldades e dar ao filho a estabilidade e o amor que ele necessita para crescer saudável e feliz. Tal como disse no início, todas as famílias são diferentes, os seus padrões de relacionamento e dificuldades são distintos, mas acredito que todas elas conseguirão encontrar um equilíbrio e implementar estratégias que lhes permitam educar os filhos e contribuir para que se tornem adultos felizes.